sábado, 8 de maio de 2010

Foder e ir às compras - Em cena no São Luiz

Ontem fui ao teatro ver uma peça que é uma espécie de murro no estômago, talvez por isso comece logo com um dos personagens a vomitar...
Foder e ir às compras (em inglês Shopping and Fucking), assim se chama esta espécie de comédia trágica, em exibição no Teatro São Luiz que põe a nú uma sociedade que pode muito bem ser a nossa.
Conta a história de três "amigos/amantes" dependentes uns dos outros nesta teia de relações humanas em que vivemos. O desequílibrio surge quando um deles decide ir embora, supostamente para entrar para clínica de desintoxicação. O que vemos a partir daí são duas personagens, Robbie e Lulu, a lutar pela sobrevivência, seja a roubar, a vender drogas, a atender chamadas eróticas...
Mark, o que partiu, está no outro prato da balança, recuperado, ou pelo menos assim o julga ele, mas sabe que o que o atormenta é o seu espírito inquieto, é aquela voz lá dentro que o instiga a questionar-se: "Porque é que só sinto alguma coisa quando estou sob o efeito de substâncias químicas?". Este é, a meu ver, o ponto alto da peça, quando Mark se torna um livro aberto para o público e um reflexo da sociedade actual.
Foder e ir às compras mostra-nos uma realidade em que tudo é transaccionável, até as pessoas, porque os sentimentos só servem para nos tornar mais frágeis e vulneráveis, mas ao mesmo tempo há a consciência de que isso está errado, porque "sentir" é humano.
No meio de tudo isto, o que mais choca não são as cenas de sexo ou os diálogos violentos, o que é realmente estranho é ver a reacção do público, que ri nervosamente quando confrontado com tudo isto... O que prova, claramente, que é mais fácil rir do que pensar (não que eu tivesse dúvidas disso).
Para quem estuda ou trabalha na área da Sociologia, deixo uma sugestão: talvez fosse interessante fazer um breve inquérito às pessoas que assistiram à peça, podia ser anónimo, pedindo apenas total honestidade. Julgo que as conclusões seriam um bom espelho do que é a nossa sociedade. Pelo que pude observar, houve quem saísse de lá completamente chocado, quem estivesse a rir imaturamente, quem não dissesse nada, como se ainda estivesse a tentar digerir tudo aquilo... Mas também me parece que, em alguns casos, saíram de lá tão vazios como entraram, e esses sim, são os casos preocupantes, porque são aqueles que já menos sentem...

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